sexta-feira, 2 de maio de 2014

Os Consórcios Públicos e a Lei de Responsabilidade Fiscal

Ementa: Consórcios Públicos. Administração Pública Indireta - Dispensa de entrega dos Relatórios previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal. Obrigação dos Municípios Consorciados

CONSULTA

Trata-se de consulta formulada por gestor público municipal que deseja saber se os Consórcios Públicos Municipais estão ou não obrigados a entregar os Relatórios previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal. 

A dúvida suscitada pelo consulente decorre do entendimento segundo qual tal obrigatoriedade não consta expressamente na Lei Complementar n° 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), nem da Lei n° 11.107/05, que criou e regulamentou os Consórcios Públicos. 

PARECER 

Os consórcios públicos municipais são entidades públicas associadas, criadas por leis de ratificação do protocolo de intenções firmado por vários municípios, e por conseqüência se inserem no conceito daquelas entidades mencionadas no artigo 173 da Constituição Federal

De acordo com o artigo 241 da Constituição Federal de 1988, com a redação que lhe foi dada pela Emenda Constitucional n° 19/98, a União, os Estados, o Distrito Federal, e os Municípios, disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviço, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos. 

Para responder a indagação do consulente é necessário esclarecer a natureza jurídica dos consórcios públicos e demonstrar que seu regime jurídico é híbrido porque sua atuação sujeita-se às normas de direito público e de direito privado em relação aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributárias.

Pelo que se vê do dispositivo constitucional citado, a lei que cria e disciplina o consórcio público é a lei editada pelo respectivo ente federado. No caso dos consórcios municipais, a lei é a municipal e não a federal, como deixou entender o consulente ao mencionar que Lei n° 11.107/05 criou e regulamentou os Consórcios Públicos. 

Em verdade, ao editar a Lei n° 11.107/05, a União utilizou-se da competência que lhe foi atribuída pelo artigo 22, inciso XXVII, da Constituição Federal, e nada mais fez do que dispor sobre normas gerais aplicáveis às contratações levadas a efeito pelos consórcios públicos, tal como ocorreu com a edição da Lei n° 8.666/93, que dispõe sobre licitações e contratos. 

Registre-se que os consórcios públicos municipais são entidades públicas associadas, criadas por leis de ratificação do protocolo de intenções firmado por vários municípios, e por conseqüência se inserem no conceito daquelas entidades mencionadas no artigo 173, §1°, da Constituição Federal, e integra a administração indireta de cada um dos entes conveniados que o criou para prestar serviços públicos de forma descentralizada, como ocorre com as sociedades de economia mista e as empresas públicas e demais entidades estatais dependentes. 

Assentado esse entendimento, temos que a Lei n° 11.107/05, subordinou os consórcios públicos às normas gerais de licitação, celebração de contratos, prestação de contas, e admissão de pessoal à observância de critérios semelhantes aos adotados para as demais entidades da administração indireta, acrescidos de alguns privilégios como possibilidade de promover desapropriação e instituir servidão, elevação dos limites de licitação, e dispensa de licitação nos casos que menciona, dentre outros. 

Da mesma forma que as demais entidades da administração indireta, os consórcios públicos também estão obrigados pela Lei de Responsabilidade Fiscal a fornecer as informações necessárias para que suas atividades financeira e orçamentária mensais sejam consolidadas nas contas de cada um dos entes conveniados, no caso os municípios que integram o consórcio, a fim de que os titulares dos respectivos Poderes Municipais possam publicar, até trinta dias após o encerramento de cada bimestre, o Relatório Resumido da Execução Orçamentária (RREO), a que se refere o artigo 54 da Lei de Responsabilidade Fiscal, e o artigo 165, §3°, da Constituição Federal de 1988. 

Como se vê, o consórcio público municipal é uma entidade estatal dependente que integra o orçamento geral dos Municípios consorciados e, por isso, precisam municiar os órgãos que lhes repassa os recursos necessários às suas atividades com as informações necessárias à comprovação de seu desempenho, demonstrando inclusive que alcançou as metas físicas previstas como contrapartida operacional pelos valores que lhe foram repassados pelo Erário dos consorciados.

A título de exemplificação, citamos o caso de um consórcio público de saúde que recebeu R$ 50.000,00, sendo R$5.000,00, de cada um dos 10 Municípios consorciados, e comprometeu-se a prestar 1.000 atendimentos. Supondo-se que proporcionalmente, cada Município previu em sua Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), a meta de 100 atendimentos como contrapartida dos valores repassados ao consórcio. 

Se o consórcio não prestar as informações aos Municípios consorciados, como é que as entidades consorciadas irão obedecer as normas de contabilidade pública e elaborar suas demonstrações contábeis em relação aos recursos repassados ao consórcio, conforme previsto no artigo 50, inciso III, da Lei Complementar n° 101/00?

Assim, para que a administração central de cada Município consorciado possa elaborar, de dois em dois meses, o RREO e demonstrar a movimentação financeira dos Poderes Legislativo, Executivo, e nas entidades descentralizadas, como é o caso dos consórcios públicos a quem repassa recursos, os titulares destes órgãos devem, mensalmente, enviar cópias de seus balanços orçamentários e financeiros aos Municípios consorciados, a fim de possibilitar que a contabilidade central de cada Município possa consolidar em seus respectivos orçamentos os recursos repassados, e demonstrar no citado relatório sua execução, em atendimento ao artigo 52 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Realmente, assiste razão ao consulente ao mencionar que a legislação citada (Lei Complementar n° 101/00 e Lei Federal n° 11.107/05) não traz disposição expressa sobre a obrigatoriedade ou não de os consórcios públicos elaborarem os relatórios previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal. 

Analisando os dispositivos da mencionada lei complementar (artigos 52 e 54), constatamos que a obrigação de entregar os RREO e RGF, no âmbito municipal, é dirigida apenas aos Municípios consorciados, posto que ao tratar do Relatório de Gestão Fiscal da entidade federada com a consolidação da movimentação financeira e orçamentária de seus órgãos, o artigo 54 refere-se aos titulares dos Poderes e órgãos referidos em seu artigo 20, cujo §2°, inciso II, letra "d", não faz qualquer referência aos consórcios públicos municipais, pelo que entendemos não estarem os consórcios públicos municipais sujeitos às regras relacionadas á entrega ou elaboração dos relatórios previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal. 

Assim, sem prejuízo das penalidades que possam advir aos gestores dos consórcios públicos municipais pela inobservância de suas obrigações legais e estatutárias relacionadas à transparência da gestão fiscal dos recursos recebidos dos Municípios consorciados, o que depreendemos da Lei de Responsabilidade Fiscal é a obrigatoriedade de os consórcios públicos municipais encaminharem aos Municípios consorciados, mensalmente, as informações necessárias à elaboração, publicação e divulgação do Relatório Resumido de Execução Orçamentária (RREO), e do Relatório de execução Orçamentária (REO). 

Portanto, respondendo objetivamente a indagação do consulente, entendemos que os consórcios públicos municipais não estão obrigados a elaborar, publicar e divulgar os relatórios previstos nos artigos 52 e 54 da Lei de Responsabilidade Fiscal, uma vez que tal obrigação compete aos respectivos Municípios consorciados.

É o parecer, s.m.j. 

Rio de Janeiro, 15 de outubro de 2010.

SERGIO ARAUJO NUNES

 Consultor